«Estrelas & Ouriços – Artigo opinião » “A importância da Psicomotricidade no brincar ”– Dra. Patrícia Pires e Dra. Carolina Costa

Depois de ler este título, acreditamos que surjam várias questões, que antes de avançarmos devem ser esclarecidas. Primeiramente “o que é a Psicomotricidade?” e, em seguida, “como é que o brincar surge como ferramenta terapêutica?”.

A Psicomotricidade é uma área científica que tem por base o corpo em movimento, e é através da interação recíproca sujeito-contexto, que é promovido o desenvolvimento global das crianças, nomeadamente as habilidades motoras, cognitivas, psíquicas e socioemocionais. A exploração do envolvimento, permite não só interagir com o espaço, com o outro, como também conhecer os próprios limites corporais. Além disso, esta área promove as competências psicomotoras (ex: tonicidade, noção do corpo e motricidade fina) essenciais para alcançar as funções cognitivas superiores fulcrais nas competências académicas.

O brincar surge como grande aliado terapêutico, pois permite movimento e consequentemente a exploração de novos contextos, objetos, ritmos, expressão corporal, entre outros. É, igualmente, um ato social que permite uma comunicação verbal e não verbal, permitindo expressar sentimentos e interesses.

Nas idades precoces, o manuseamento dos brinquedos e a sua exploração ativa possibilita a noção onde termina o corpo da criança, o “eu”, e começa o objeto.  Através desta manipulação, surgem movimentos corporais até então desconhecidos, contacto com diferentes texturas, cores e sons.

Durante os momentos lúdicos ocorre o desenvolvimento de componentes psicomotoras, a noção temporal poderá surgir através de instrumentos musicais, batimento de palmas, canções ou mesmo através do tempo de resposta do adulto ao estímulo da criança. Por outro lado, a noção do corpo, a noção espacial e o equilíbrio surgem de momentos lúdicos em parques infantis, de andar no escorrega, de trepar e perceber onde os pés devem ser colocados estrategicamente para alcançar o topo, de passar por dentro de túneis de pano, ou dançar, são apenas alguns exemplos.

O jogo simbólico (ex.: faz de conta) permite um desenvolvimento integrado da criança, diversas competências socio-emocionais, de imaginação e expressão corporal. É através destes momentos lúdicos que a criança constrói o seu mundo imaginário, com base em experiências vividas, como imitar os pais a cozinhar, utilizar objetos de casa para criar histórias ou até interpretar personagens.

Acreditamos que brincar com regras, (ex.: o jogo de tabuleiro), é fundamental, visto que trabalha as competências de autoregulação, de resolução de problemas, de cognição e de cooperação. Brincar com o outro cria um leque de possibilidades sociais, nomeadamente, de partilha, de noção de vez, de tempo de espera e de interpretação da expressão do outro.

Ao trazermos os conceitos de psicomotricidade, de brincar e a sua interação, realçamos a importância da relação do psicomotricista com a criança. Esta relação estimula o interesse pela exploração dos brinquedos, do pensamento simbólico, o interesse pelo outro e ainda o jogo com regras. O psicomotricista orienta o brincar tendo em conta objetivos terapêuticos previamente estabelecidos para a criança. Através deste momento prazeroso são promovidas competências psicomotoras, sociais e emocionais, ou até mesmo aprendizagens pré-académicas.

Ainda que exista uma intervenção psicomotora, os pais assumem um papel extremamente importante no processo terapêutico. O plano de intervenção carece de uma participação ativa dos pais para estabelecer os objetivos importantes a desenvolver com o seu filho. A possibilidade de trabalhar estes objetivos surge de forma espontânea na rotina familiar, sendo potenciados no contexto da criança.

A própria relação recíproca, os primeiros olhares, os sorrisos, as gargalhadas, são as primeiras interações que o bebé realiza com os pais e que já estão a promover o seu desenvolvimento. Quando os pais brincam com o seu filho, mesmo sem objetivos pré-estabelecidos com o psicomotricista, promovem a interação e interesse pelo outro e a interpretação das suas expressões verbais e não verbais.

Nas rotinas (ex.: vestir, banho, refeições, etc.), surgem naturalmente diversos momentos que podem ser de estimulação mas que não lhes é dado a devida importância, como o comer e calçar autonomamente, nomear as partes do corpo durante o banho e ainda, as peças de roupa durante o vestir.

Realçamos que estas aprendizagens podem e devem ser promovidas através de interações lúdicas. Por vezes, os pais necessitam de estratégias e de orientações do psicomotricista para criar estas oportunidades.  Acima de tudo, estes momentos prazerosos, além de potenciar as competências, fortalecem a relação entre os pais e o filho e possibilitam que a criança realize o transfer das interações parentais, ou com o psicomotricista, para as interações com os pares.

Concluímos assim, que os momentos lúdicos são de extrema importância no desenvolvimento global da criança, seja no seu dia-a-dia em família ou em contexto terapêutico com o psicomotricista.

Autores: Patrícia Pires e Carolina Costa, Técnicas de Reabilitação Psicomotora

Fonte: Estrelas & Ouriços