«SapoLifestyle – Artigo opinião» “Eu, tu, nós: A empatia na Perturbação do Espetro do Autismo” Maria Borges , Psicóloga Clinica do PIN

Desde o início do estudo da Perturbação do Espectro do Autismo (PEA), com características de impacto ligeiro no seu funcionamento, autores como Hans Asperger e Leo Kanner, definem as alterações da interação social como uma das principais características desta Perturbação do Neurodesenvolvimento, mantendo-se como um dos principais critérios de diagnóstico.

As alterações da interação social podem-se manifestar de diferentes formas: lacunas no uso e interpretação de comportamentos não verbais (ex. contacto visual, expressão facial, gestos); dificuldade em iniciar e manter interações sociais adequadas; diminuição da espontaneidade para partilhar pedidos, emoções e interesses com outros, entre outras.

Para melhor compreender as alterações mencionadas, é importante conhecer a Teoria da Mente. A mesma refere-se à capacidade de um indivíduo reconhecer e compreender o que os outros pensam, acreditam e desejam e quais as suas intenções, com a finalidade de entender o seu comportamento e antecipar o que farão de seguida. Por outras palavras, é a capacidade para se “colocar na pele do outro”.

É esperado que uma criança com desenvolvimento neurotípico consiga, a partir dos 4/5 anos, começar a compreender os códigos sociais que indicam os pensamentos e sentimento dos outros. Na PEA, o mesmo pode não acontecer, uma vez que estes indivíduos prestam maior atenção aos pormenores do ambiente físico, ao invés do social. Ou seja, a criança ou adulto do espectro do autismo pode não reconhecer e compreender as pistas que indicam os pensamentos e sentimentos das outras pessoas, consoante o que seria de esperar para a idade. A literatura sugere que existe também uma explicação neurológica, relacionada com o défice na ativação de algumas zonas cerebrais. Esta questão na PEA é muitas vezes confundida com “falta de empatia”.

Ou seja, na PEA parecer existir uma maior dificuldade para a aquisição das competências associadas à Teoria da Mente e, a capacidade de ser empático pode desenvolver-se mais tarde. Contudo, estes indivíduos não carecem da mesma! Um indivíduo do espectro do autismo preocupa-se com os outros, todavia pode ter maior dificuldade em reconhecer os sinais sociais mais subtis. Este pode conseguir utilizar a Teoria da Mente em situações simples, mas poderá ter algumas dificuldades em aplicar a mesma a situações mais complexas, como geralmente são as da vida real.

Algumas das consequências da alteração na aquisição das competências da Teoria da Mente são:

  • Dificuldade em interpretar as mensagens sociais transmitidas pelo contacto visual;
  • Tendência para fazer interpretações literais das situações e/ ou comentários;
  • Propensão para uma postura e comunicação egocêntrica;
  • Maior sinceridade, sentido de justiça e cumprimento das regras;
  • Não procura da ajuda dos outros na resolução de problema;
  • Défice na interpretação e gestão dos conflitos;
  • Menor rapidez e qualidade no raciocínio social;
  • Dificuldades em prever o comportamento das pessoas;
  • Lacunas na interpretação de gestos e expressões faciais;
  • Dificuldade em compreender o impacto do próprio comportamento nos outros.

Agora que percebemos como é importante a Teoria da Mente, importa referir algumas das estratégias para o treino de competências socio-emocionais, melhorando a compreensão e identificação de pistas sociais:

  • Promover o jogo faz de conta;
  • Explorar histórias sociais;
  • Utilizar materiais didáticos (fotografias, jogos, filmes, entre outros);
  • Desenvolver role-plays;
  • Promoção de grupos de desenvolvimento de competências sociais;
  • Criar dicionário de expressões e metáforas.

O mais importante é ser modelo, empatizar.

Um artigo da psicóloga clínica Maria Borges, do PIN.